terça-feira, 13 de outubro de 2009

Da Ilegalidade do Bloqueio do FPM pelo INSS: Algumas Considerações

O Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) vem, de forma absurda – por força de acordos e planos de parcelamentos que os Municípios brasileiros têm firmado para a quitação de contribuições sociais vencidas e não recolhidas – arrecadando valores extorsivos dos Municípios com a Retenção do FPM (Fundo de Participação dos Municípios) para pagamento das parcelas inadimplentes, mas que nem sempre são devidas, mesmo que seja a pretexto da consolidação de dívida fiscal e sua confissão através de Lançamento de Débito Confessado, ou albergando-se tal procedimento no Art. 160, parágrafo único, da CF/88.

Inicialmente, a proposta de parcelamento feita pela previdência parecia ser viável aos municípios. Entretanto, os prefeitos não esperavam que a autarquia previdenciária utilizasse do TADF (Termo de Amortização de Dívida Fiscal) como subterfúgio para fazer deduções superiores às pactuadas no termo, ao argumento de que a previsão de tal possibilidade já era de conhecimento dos municípios, fazendo com que, desde a data de assinatura dos acordos, o INSS jamais tenha respeitado o percentual estabelecido, gerando retenções no FPM bem maiores que o previsto.

Com isso, os municípios têm sofrido muitos constrangimentos – em especial, nos últimos cinco anos – através da acentuada redução de receitas e fluxo de caixa para quitar todas as suas despesas correntes, como folhas de pagamento, repasses a fundações de saúde, conservação, manutenção e reparo de rodovias, saneamento básico, educação, o que, por outro lado, consolida a sua crescente e contínua dependência de recursos provenientes de convênios com os Estados e a União para a realização de obras importantes.

Ou seja, os Municípios estão ficando sem as mínimas condições financeiras para cumprir sua função social, enquanto os seus gestores estão sendo submetidos, cada vez mais, ao controle político das entidades federativas maiores, o Estado e a União.

Com relação ao disposto no Art. 160, modificado por força da EC nº 3, Roque Antonio Carrazza dá a seguinte lição:
"A EC nº 3, de 17.03.93, de modo inconstitucional (porque atropelou a autonomia dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal), deploravelmente mandou acrescentar um § 4º ao art. 167, do seguinte teor: "É permitida a vinculação de receitas próprias geradas pelos impostos a que se referem os arts. 155 e 156, e dos recursos de que tratam os arts. 157, 158 e 159, I, "a" e "b", e II, para a prestação de garantia ou contragarantia à União e para pagamento de débitos para com esta (art. 1º)." (ROQUE ANTÔNIO CARRAZZA – Curso de Direito Constitucional Tributário).

Por isso é que, por exemplo, especificamente sobre as normas constitucionais inscritas no artigo 160 e seu parágrafo único, entende o Professor IVES GANDRA MARTINS que:
"A transferência para os Estados, os Municípios e o Distrito Federal, ressalvada a hipótese do parágrafo único, não é suscetível de qualquer espécie de bloqueio. As dívidas dos entes federativos não permitem a autocompensação, por força do dispositivo mencionado. (MARTINS, Ives Gandra. "A Constituição Aplicada", cit., v. 2, p. 80)

E poderíamos, a partir daqui, redigir um artigo inteiro sobre o poder constituinte derivado ou reformador e as suas limitações, ao invés de fazer comentários ou anexarmos pensamentos doutrinários, mas preferimos ser breves e corroborar do escólio do Jurista e Parlamentar MICHEL TEMER, que ensina:
"Outra vedação implícita é a impediente de reforma constitucional que reduza as competências dos Estados Federados. Assim, não é permitido ao exercente da competência reformadora localizar as competências residuais dos Estados e, por emenda aditiva, acrescentá-las às da União ou do Município, pois isto tende a abolir a Federação.
É que, em dado instante, o Texto Constitucional, embora mantivesse intacta a sua letra, estaria substancialmente modificado na medida em que os Estados Federados não tivessem nenhuma competência." (TEMER, Michel. "Elementos de Direito Constitucional", 9a Ed., Malheiros Editores, 1992, pp. 35-36)

Assim, entendemos que, mesmo com os ditames do Art. 160 da CF/88, a retenção do FPM pelo INSS para garantia do pagamento dos seus créditos não o autoriza a proceder a verdadeira manipulação e ingerência nas contas dos Municípios, pois isso seria “ferir de morte” o princípio da autonomia municipal, previsto no Art. 18 da CF/88. Trata-se aqui de uma verdadeira interpretação sistemática que, de conseqüência, é de inteira pertinência a dita do emérito jurista italiano Norberto Bobbio, in verbis:

“Chama-se ‘interpretação sistemática’ aquela forma de interpretação que tira os seus argumentos do pressuposto de que as normas de um ordenamento, ou, mais exatamente, de uma parte do ordenamento (como o direito privado, o Direito Penal) constituam uma totalidade ordenada (mesmo que depois se deixe um pouco no vazio o que se deva entender com essa expressão), e, portanto, seja lícito esclarecer uma norma obscura ou diretamente integrar uma norma deficiente recorrendo ao chamado ‘espírito do sistema’, mesmo indo contra aquilo que resultaria de uma interpretação meramente literal” (in Teoria do Ordenamento Jurídico, Ed. UnB, pág. 76).

Portanto, em procedendo a todas esse estudo em sua interpretação mais apropriada, entendemos que, sendo proibida a intervenção da União no Município, muito menos se permite que possa fazê-lo suas autarquias, por motivo de falta de pagamento de seus créditos, ainda que utilizando-se da União como intermediária para esse fim.

Nessa mesma linha de pensamento, o saudoso GERALDO ATALIBA legou-nos as lições a seguir:
"Alguns princípios constitucionais foram postos tradicionalmente pelos nossos sucessivos legisladores constituintes como fundamentais a todo o sistema e, por isso, em posição de eminência relativamente a outros... Deles os mais importantes são os da federação e da república. Por isso, exercem função capitular da mais transcendental importância, determinando inclusive como se devem interpretar os demais, cuja exegese e aplicação jamais poderão ensejar menoscabo ou detrimento para força, eficácia e extensão dos primeiros. ATALIBA, Geraldo. ("Estudos e Pareces de Direito Tributário", 3º volume, Editora Revista dos Tribunais, 1980, pp. 9-13.)

Ainda a propósito, e no mesmo rumo, as lições de JOSÉ SOUTO MAIOR BORGES, ainda no regime da Constituição anterior, no sentido de que:
"... é um princípio que informa toda a estrutura da Constituição brasileira, a isonomia das pessoas constitucionais. Não há desníveis hierárquicos entre as pessoas constitucionais, que juridicamente são iguais entre si, posto sociológica, econômica e politicamente não o sejam.

E ainda complementa:
"Por outro lado, os Municípios não têm a sua existência decorrente de uma simples delegação administrativa do Estado-membro, porque a sua autonomia é alçada à eminência de um princípio constitucional expresso. Dessa autonomia municipal - cuja observância é obrigatória para a União e para os Estados-membros - resulta a competência para o autogoverno, a administração própria no que respeite ao peculiar interesse municipal.

A mais recente nomeada Ministra do STF, CÁRMEM LÚCIA ANTUNES ROCHA ainda nos traz:
"Detém o Município uma competência que lhe é, pois, privativa, vale dizer, eliminatória da presença de outras entidades políticas na mesma matéria. Essa competência é afirmada, especialmente, pela garantia constitucional de que os próprios Municípios elaboram as suas respectivas Leis Orgânicas (art. 29). São estas que oferecem os fundamentos da organização municipal, assegurando-se, pois, dessa forma, a auto-organização política e autônoma das entidades locais".

Nesse sentido, ainda cabe aqui como ilustração literária à nossa conclusão sobre o caso em tela, o ensinamento de Celso Antonio BANDEIRA DE MELO afirma quanto à violação de um princípio:
"É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra".

E a doutrina do Professor CELSO RIBEIRO BASTOS, sobre este assunto, ministrando-nos a seguinte lição:
"À semelhança dos Estados-Membros, o Município brasileiro é dotado de autonomia, a qual, para que seja efetiva, pressupõe ao menos um governo próprio e a titularidade de competências privativas. Nos arts. 29 e 30 a Constituição Federal assegura os elementos indispensáveis à configuração da autonomia municipal".
......................................
"A Constituição Federal estabelece uma verdadeira paridade de tratamento entre o Município e as demais pessoas jurídicas, assegurando-lhes autonomia de autogoverno, de administração própria e de legislação própria no âmbito de sua competência (arts. 29, I, e 30 e incisos), autonomia que se confirma pelo disposto no art. 35, que proíbe a intervenção do Estado nos Municípios, salvo ocorrendo uma das hipóteses autorizadoras."
Aliás, um dos motivos que autorizam a intervenção federal no Estado é a ofensa ao princípio da "autonomia municipal" (art. 34, VII, c). Já quanto à intervenção do Estado no Município, uma das hipóteses que a autoriza é "deixar de ser paga, sem motivo de força maior, por dois anos consecutivos, a dívida fundada" (art. 35, I).

Sendo assim, não se pode olvidar que quando uma Autarquia, credora de um Município, arroga a si o direito de reter suas cotas do Fundo de Participação, para pagamento de seus créditos, não há dúvida que nega ao Município a autonomia para aplicar suas rendas, praticando, por vias transversas, a substituição da vontade do Prefeito, pela do Dirigente da Autarquia.

Ora, isso equivale ao mesmo que afastar o Prefeito de suas atribuições, no atinente à Administração das rendas do Município, havendo débito para com a Previdência Social, principalmente se o valor deste for superior à quota a que faça jus o município, como tem decidido a Justiça Federal em suas várias regiões:

1302014946 - TRIBUTÁRIO - ADMINISTRATIVO - NULIDADE DO TERMO DE AMORTIZAÇÃO DE DÍVIDA PREVIDENCIÁRIA - TADF - MUNICÍPIO DEVEDOR - RETENÇÃO DO FPM - AUSÊNCIA DE PRÉVIA AUTORIZAÇÃO DA CÂMARA DE VEREADORES - NECESSIDADE - LEI 9.639/98 - REQUISITOS APLICÁVEIS APENAS AO INSS - PRINCÍPIO FEDERATIVO - AUTONOMIA MUNICIPAL - OBRIGAÇÕES CORRENTES - IMPOSSIBILIDADE - REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO DO INSS IMPROVIDAS - 1. É imprescindível a autorização do Poder Legislativo Municipal para a firmação de acordo que trate da retenção de valores do FPM, em face de dívidas previdenciárias, a teor das normas legais que dispõem sobre responsabilidade dos Prefeitos e Vereadores. 2. A prescrição da Lei 9.639/98, quanto à necessidade da autorização da Câmara de Vereadores apenas para as dívidas contraídas por Sociedades de Economia Mista, aplica-se somente em relação ao INSS, pois quanto ao Município, em razão da sua autonomia legislativa, administrativa e financeira, as regras impostas a sua participação em negócios jurídicos são advindas de seu Poder Legislativo Municipal. 3. Por se tratar de norma de Direito Público, e, portanto, indisponível, o percebimento das verbas referentes ao FPM não podem ser objeto de negócio jurídico, de feitio negocial simples, tampouco terem parcela retida pelo INSS. 4. O art. 160, parág. Único, I da CF/88 somente admite o bloqueio de recursos do FPM para pagamento de créditos tributários devidamente constituídos, qualificados pela liquidez, exigibilidade e certeza, atributos não inerentes às obrigações correntes. 5. Remessa Oficial e Apelação do INSS improvidas. (TRF 5ª R. - AC 2003.80.00.006961-4 - 1ª T. - AL - Rel. Des. Fed. Ubaldo Ataide - DJU 31.10.2005 - p. 86) JCF.160 JCF.160.I

Ou seja, tal violência se sobrepõe ao interesses público proveniente da comunidade, gerando uma verdadeira intervenção no ente municipal, violando o Código Tributário Nacional, pois o “crédito” a ser cobrado ainda não existe.
Não se pode admitir a existência do crédito sem a sua regular constituição, o que se dá por meio do lançamento tributário, uma vez que até mesmo a contribuição previdenciária está erigida a plena categoria de tributo, inclusive, devendo respeitar tais leis para se fazer cobrar.

E por falar nisso, sabemos que a lei exige, além da constituição do crédito tributário pela autoridade competente, que deva ser o contribuinte regularmente notificado deste lançamento, já que somente a partir de tal evento, é que se considera exigível o crédito, como, mais uma vez, extraimos da decisão a seguir:

1302017659 - CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO - ART. 160, PARÁG. ÚNICO, INC. I DA CF - RETENÇÃO DO FPM PARA PAGAMENTO DE CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS REGULARMENTE CONSTITUÍDOS - ART. 38, PARÁG. 12 DA LEI 8.212/91 E CLÁUSULA 6ª - DO TADF FIRMADO ENTRE O INSS E OS MUNICÍPIOS - RETENÇÃO DO FPM - OBRIGAÇÕES PREVIDÊNCIÁRIAS CORRENTES - INCONSTITUCIONALIDADE - MERA APRESENTAÇÃO DA GFIP NÃO CONSTITUI, POR SI SÓ, O CRÉDITO PREVIDÊNCIÁRIO - NECESSIDADE DE PROCEDIMENTO EM QUE SE ASSEGURE O DEVIDO PROCESSO LEGAL - OFENSA AO PRINCÍPIO DA AUTONOMIA MUNICIPAL - 1. O art. 160, parág. Único, inciso I da CF admite, por exceção, que os recursos destinados ao FPM sejam retidos para o pagamento dos créditos previdenciários a cargo do Município; por outro lado, o art. 38, parág. 12 da Lei 8.212/91 e a cláusula 6ª do TADF firmado entre o INSS e os Municípios impõem o bloqueio do FPM para o pagamento de obrigações previdenciárias correntes do ente municipal. 2. Na sistemática de retenção do FPM para o pagamento de obrigações correntes do Município, ainda não há, efetivamente, crédito tributário, qualificado pelos atributos da certeza e liquidez, já que a sua constituição legítima deve sempre resultar de procedimento administrativo tributário regular, desenvolvido com a observância de todas as garantias do devido processo legal. 3. O Município, ao fornecer ao INSS, através da apresentação da GFIP, elementos para a quantificação da obrigação previdenciária, vêse compelido a preencher campos obrigatórios deste documento, informando dados que, mesmo sem a sua concordância, e, pior, sem que lhe seja conferida a oportunidade para questioná-los, integrarão a base de cálculo da obrigação previdenciária. Assim, não há como se admitir que a mera apresentação da GFIP pelo Município seja apta a, por si só, constituir o crédito previdenciário. 4. Inconstitucionalidade do art. 38, parág. 12 da Lei 8.212/91 e da cláusula 6ª do TADF por ofensa ao art. 160 da CF e aos dispositivos constitucionais que prestigiam a autonomia dos Municípios (arts. 18 e 34, inc. VII, alínea c) e a higidez do pacto federativo (art. 1º e 60, parág. 4º, inc. I). 5. AGTR a que se dá provimento, determinando o sobrestamento do bloqueio de verbas do FPM para o pagamento das obrigações correntes do Agravante, liberando-se, por conseguinte, os valores já retidos em seu FPM sob a rubrica INSS-EMPRESA, depositados no Banco do Brasil; determina-se, ainda, que a parte Agravada (INSS) possibilite ao Município Agravante recolher as contribuições previdenciárias correntes por meio de Guia de Pagamento à Previdência (GPS), adotando as medidas que forem necessárias. 6. Embargos Declaratórios de fls. 286 a 291 e Agravo Regimental de fls. 370 a 372 prejudicados. (TRF 5ª R. - AGTR 2005.05.00.004343-6 - 2ª T. - RN - Rel. Des. Fed. Napoleão Nunes Maia Filho - DJU 30.11.2005 - p. 1.081) JCF.160 JCF.160.I JLCPS.38 JLCPS.38.12

Assim, de forma clara, temos que o crédito do INSS somente existiria e poderia ser exigido se houvesse prévio lançamento e que, deste ato, fosse o Município correspondente notificado, para que pudesse extingui-lo no prazo conferido pela legislação, sob pena de incorrer em, mais uma vez, grave violação ao princípio do devido processo legal e aos demais princípios consagrados pela Constituição, que, por sua vez, vem sofrendo uma série de investidas políticas para que sejam desviados tais recursos para outros fins, retirando do município esta importante receita.

O maior exemplo disso é justamente o artigo 160, parágrafo único, que, a nosso ver, de forma equivocada, autoriza o bloqueio dos recursos, quando os municípios estiverem em débito com a União ou suas autarquias. Mas este dispositivo deve ser interpretado em harmonia com o sistema tributário nacional, o que envolve os princípios constitucionais do devido processo legal e da autonomia dos entes administrativos, pois não se pode admitir a retenção, o bloqueio ou qualquer outra nomenclatura que possa ser dada a essa agressiva apropriação de recursos públicos, sem que haja credito definitivamente constituído.

Assim, débitos ou créditos somente são considerados líquidos e certos, e ainda, exigíveis quando, após instauração do devido processo legal e contraditório, houver sentença transitada em julgado, fundamentada em laudo pericial contábil que confirme os valores consolidados na NFLD (Notificação Fiscal de Lançamento de Débito).
Portanto, entendemos que a inconstitucionalidade da Emenda Constitucional nº 3, de 17.03.93, é incontroversa, pois atenta contra o princípio federativo, ao subordinar os interesses dos municípios e dos estados aos de autarquias federais, órgãos estes, como se sabe, criados por lei, e não pela própria Constituição, como é o caso dos municípios, principalmente na parte em que autoriza a retenção de recursos dos Fundos de Participação dos Municípios, para pagamento de débitos previdenciários, no sentido da invalidade de cláusulas de acordo em que os Municípios autorizem, quando houver falta de pagamento de débitos vencidos ou atraso no cumprimento das obrigações previdenciárias decorrentes de acordo de parcelamento, a retenção do Fundo de Participação dos Municípios – FPM e o repasse ao INSS do valor correspondente à mora.

Não há, portanto, autorização legal, muito menos constitucional, para justificar as retenções arbitrárias do INSS. A investida contra o patrimônio da pessoa de direito público, nesse caso, equivale a uma execução e penhora do patrimônio público, absoluta exceção no sistema jurídico posto, donde, para que a mesma se efetiva há que haver, no mínimo, crédito líquido e certo a ser executado, apurado mediante regular processo administrativo ou judicial.

E mais, pois nem de longe seria aceitável supor que o Constituinte tivesse pretendido submeter os peculiares interesses de uma pessoa jurídica de direito público, uma unidade autônoma política componente da federação, ao lado dos Estados federados, que é o Município (conforme art. 1º da Constituição, incrustado no Título I, primeira norma constitucional, que cuida sobre "os princípios fundamentais") aos de uma pessoa jurídica de natureza simplesmente administrativa, instituída por lei, a autarquia.

A permitir tamanha brutalidade, daqui a pouco, também a simples empresa pública, ou mesmo uma sociedade de economia mista, poderá vir a ser posta, por Emenda Constitucional, em nível hierárquico bem superior ao dos Estados da federação e dos Municípios. E estes, de pessoas jurídicas de direito público autônomas, política e administrativamente, que são, poderão passar a sujeitos de direito subordinados a entidades administrativas ou comerciais criadas por lei ordinária.

Por fim, é importante que os municípios, como contribuintes que são, possam buscar soluções jurídicas para estancar as ilegalidades cometidas pela autarquia previdenciária, restaurando, assim, sua autonomia municipal em prol da supremacia do interesse público e do equilíbrio financeiro. Sendo proibida a intervenção da União no Município, muito menos se permite que possa fazê-lo suas autarquias, por motivo de falta de pagamento de seus créditos, ainda que utilizando-se da União como intermediária para esse fim. Por tais motivos, é que se faz necessário o ajuizamento de competente medida judicial, com o objetivo de determinar ao INSS que se abstenha de exigir contribuição previdenciária do Município sob a forma de RETENÇÃO ou BLOQUEIO, pois temos como liame à convicção que SEM JUSTIÇA TRIBUTÁRIA NÃO HÁ JUSTIÇA SOCIAL.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

A TERCEIRIZAÇÃO DE SERVIÇOS NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: ASPECTOS LEGAIS

1. DA QUEDA DO FPM GERADA PELA CRISE FINANCEIRA MUNDIAL

No ano passado, a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) já previa sérios problemas financeiros para os prefeitos que tomariam posse em janeiro deste ano, diante da crise financeira internacional. O repasse do 3º decêndio de fevereiro do Fundo de Participação de Municípios (FPM), referente ao volume de arrecadação do dia 10 a 20 do mês – depósito realizado na conta das prefeituras nesta sexta-feira, 27 de fevereiro – confirmou a previsão da Confederação Nacional de Municípios (CNM).

As receitas federais (Imposto de Renda e Imposto sobre Produtos Industrializados) que servem de base para o cálculo do Fundo estão numa tendência de declínio. “Neste ano, os prefeitos terão que se empenhar em cortar algumas despesas, principalmente no custeio, e não contarão com um superávit primário tão expressivo como nos anos anteriores”, finaliza o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski em entrevista concedida recentemente à Imprensa e disponível ao público em seu portal na internet.

Com a devida vênia do ilustre líder municipalista, de quem temos a honra de desfrutar de amizade e respeito, em nossa opinião, o que tem ocorrido é uma verdadeira sangria de Estados e Municípios por parte da União, através de medidas tomadas unilateralmente pelo ente maior, promovendo renuncia fiscal, sem sequer consultar às demais entidades administrativas se estariam dispostas ou em condições de suportar tal abdicação de receitas. A União reduz sua arrecadação de IPI (Imposto sobre a Produção Industrial) e IR (Imposto de Renda), sacrificando também Estados e, principalmente, Municípios (pois a grande maioria deles vive apenas dos repasses constitucionais), mas, em compensação própria e exclusiva, aumenta as alíquotas de IOF (Imposto sobre operações Financeiras), COFINS e outras contribuições.

O resumo disso tudo é a situação absurda, imoral e calamitosa que se tem presenciado: a União, tratando a CRISE como uma “marolinha”, segundo as palavras do próprio Presidente da República, pois procurou compensar sua perda de arrecadação, e por isso continua gastando dinheiro como se nada estivesse acontecendo, enquanto Estados e Municípios, sem condições de pagarem nem suas folhas de pagamento, mínguam por saídas, soluções, além de terem que mendigar recursos à União.

Pasmem senhores leitores, que pequenos municípios, como a pequena Cantanhede, no Estado do Maranhão, com aproximadamente 20 mil habitantes, recebeu este mês cerca de 1 milhão de reais a menos do que teria recebido no ano de 2008, no mesmo mês de setembro: o recurso caiu mais da metade, comprometendo até mesmo os repasses devidos às Câmaras Municipais. E o alerta para os vereadores é o de que procurem negociar com os prefeitos medidas para economizar em meio à crise, pois os orçamentos das câmaras, para o ano que vem, terão como base a arrecadação pífia desse ano. Ou seja, ano que vem as coisas podem melhorar para os municípios e piorar bastante para as câmaras.

Registre-se aqui que tais dados, apesar de negados ou simplesmente ignorados pela Presidência da República, foram demonstrados pelo próprio prefeito José Martinho, o “Cabão”, como é conhecido pelos mais próximos, de quem desfrutamos uma boa amizade.


2. IDÉIAS, CONVERSAS E “PROMESSAS” DE PACOTES E ALTERNATIVAS À CRISE.

Uma recente matéria de Fernando Exman e Natuza Nery traz que o governo definiria, até o final de março deste ano de 2009, medidas para aliviar as finanças dos municípios, abatidos pela redução de repasses de recursos federais por conta da crise financeira global e de cortes em impostos para estimular setores da economia. Segundo os jornalistas, após participar de reunião da coordenação política com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ministro José Múcio Monteiro, das Relações Institucionais, disse nesta terça-feira que o governo deve ter uma posição nesta semana, mas não antecipou se será anunciada até quinta-feira, véspera do feriado, ou se ficaria para depois da Semana Santa. "O presidente Lula vai se reunir com a equipe econômica para ver quais medidas serão tomadas", disse Múcio a jornalistas na ocasião.

Entre as possibilidades em estudo para compensar os municípios, estavam a redução do patamar de parcelamento com a Previdência e a redução da contrapartida para projetos de infra-estrutura, inclusive os do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Ainda segundo eles, fonte do governo disse que a compensação chegaria a municípios com menos de 23,7 mil habitantes --foco do problema-- e tenderia a prestigiar cidades do Norte e do Nordeste dependentes dos repasses federais.

Entretanto, NADA DISSO SE REALIZOU, exceto a tentativa de enganar os prefeitos, a população e, mais uma vez, tornar os municípios reféns de acordos e contratos de parcelamentos inexeqüíveis. A dita ajuda ou compensação – uma ninharia que não chega a compensar sequer um único mês de crise prometida desde março de 2009 para o fim do mês de setembro desse mesmo ano – até agora não chegou ás contas dos municípios.

As previsões de 2% ao mês ou 20% de queda para este já ficou para trás há muito tempo, pois já estamos na faixa dos 50% de queda do FPM. Em reunião sobre o assunto no mês de maio deste ano, a secretária da Receita Federal, redundante, explicou a redução dos dois principais impostos que formam o FPM. O Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), que teve as alíquotas reduzidas para veículos desde o início do ano e para material de construção a partir de abril, chegará ao final do ano com arrecadação de 40 bilhões de reais, segundo a secretária. A previsão inicial era de 44,9 bilhões de reais. Já o Imposto de Renda (pessoa física e jurídica), ainda segundo a Secretária, deve passar de uma estimativa de 202,8 bilhões de reais para 185,2 bilhões de reais no ano em função da crise.

Na ocasião, senadores e municipalistas criticaram o fato de o governo ter reduzido as alíquotas de impostos que são compartilhados com Estados e Municípios como forma de combater a crise financeira internacional. "Se é para fazer favor ao mercado, que faça com a sua arrecadação. Não faça com a nossa", disparou Ziulkoski, segundo quem o FPM representa mais de 50 por cento da receita de 1.367 municípios. Para o presidente da CNM, uma solução seria municípios e o governo federal chegarem a um acordo sobre a dívida e os créditos das prefeituras com a Previdência. Segundo ele, os municípios devem 22,2 bilhões de reais, mas têm a receber 25,4 bilhões. "Que se faça um encontro de contas. Não estamos pedindo nenhum favor", cobrou.

Mas o que se resume disso tudo é que a grande verdade dos municípios é o colapso financeiro que atualmente enfrentam, inadimplentes, credores sem recebimento, demissionários a todo o momento, quebra de inúmeras economias locais, um verdadeiro caos, e nenhuma promessa cumprida ou com perspectivas claras de cumprimento por parte do governo federal.

Só resta então como uma única opção aos municípios o enxugamento forçado da máquina administrativa municipal e a busca de alternativas para economizar ao máximo, por uma questão de sobrevivência do sistema local através de estímulo e incremento de arrecadação e redução do pagamento de encargos sociais.


3. DA TERCEIRIZAÇÃO DE SERVIÇOS PELOS MUNICÍPIOS

E enquanto está se discutindo tudo que vimos a respeito da crise, municípios do Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Paraná, Ceará e Maranhão já largaram na frente nessa corrida pela redução de custos sem redução de qualidade e empregabilidade.

As administrações municipais desses Estados, em meio a essa brutal escassez de recursos, busca cada vez mais suprir suas necessidades de mão-de-obra para a realização de determinados serviços que fogem aos objetivos principais de suas atividades, pois, apesar de todos os efeitos da crise, a sociedade não interrompe sua evolução e exige cada vez mais do poder público os direitos inerentes a sua cidadania. Nisso, ao invés de inchar sua estrutura, ela deve buscar outras formas atingir seus objetivos no sentido de não prejudicar o desempenho nas áreas em que se propôs a atuar.
Dessa forma, a transferência a terceiros da realização de determinados serviços que não fazem parte de sua linha estatal de atuação possibilita focalizar suas atenções para o cumprimento de seus objetivos institucionais, em respeito, dentre outros, ao princípio da eficiência previsto constitucionalmente. Em outras palavras, trata-se da contratação de empresas legalmente constituídas, destinadas desde à sua constituição à realização destes serviços específicos, cuja interrupção poderia comprometer o bom andamento da administração. Dentre as várias situações passíveis de sofrerem esse processo de delegação por contrato, podemos citar a vigilância, a limpeza, a copa, a cozinha ou a portaria, como exemplos de terceirização de serviços mais comuns, e a saúde, como forma mais específica e aprimorada.

E dentro desse mercado, umas das mais eficientes formas de se aplicar a terceirização, de forma a possibilitar economia real ao município é a adoção do modelo cooperativista, pois “os membros cooperados, por terem regime autônomo, possuem a capacidade de produção mais aguçada pela liberdade de trabalho e, por isso mesmo, possuem um elevado grau de qualidade e presteza em seus serviços, diferenciais que estão diretamente vinculados a relação CAPITAL X TRABALHO” esclarece Ferreira, presidente de uma dessas cooperativas.

E ainda complementa, lembrando que o trabalho cooperado é eficaz por que tais entidades podem reduzir as despesas com pessoal em cerca de 30% (trinta por cento), sem comprometer a prestação dos serviços públicos, sem redução de salários ou cortes de pessoal”, preservando assim sua responsabilidade civil e social. E quando comparada com empresas não cooperativas para terceirização de serviços, a economia que a cooperativa proporciona diretamente gira em torno de 60 % a menos, pois normalmente as propostas das empresas causam um acréscimo de 90 a 100% no valor do custo inicial.

Ou seja, na terceirização por meio de cooperativas de trabalho, o trabalho por ser gerido pelos próprios sócios cooperados, torna-se mais barato. Sim, pois o trabalhador deixa de possuir os benefícios que uma CLT possa lhe assegurar para ser sócio de uma cooperativa e prestador de serviço como autônomo, com a finalidade de melhorar sua remuneração e as condições de trabalho, mediante Contrato Civil realizado entre a cooperativa de trabalho e o contratante. Mas em momento algum isso significa desamparo do trabalhador, pois o sócio-cooperado prestador de serviço deve realizar sua inscrição no INSS como contribuinte autônomo/individual, além de participar de reuniões e assembléias que a cooperativa venha a realizar sobre os interesses da classe.


3.1 Das exigências para a terceirização de serviços

Assim como já tratamos nas considerações gerais, antes expendidas, vale reproduzir algumas exigências e cautelas a serem observadas ao se pactuar tais serviços (as quais valem, por evidente, para qualquer outra contratação de serviços sob terceirização):

a) A contratação mediante prévia licitação, o que normalmente pode ser nas modalidades Tomada de Preço e Concorrência para setores custeados por recursos próprios do município, e preferencialmente Pregão para quando se tratar de repasses de verbas federais específicas, como Saúde e Educação.

b) A descrição do objeto de forma certa e objetiva, com especial atenção ao que prescreve o art. 40 da Lei nº 8.666. A importância deste procedimento é que o município deve se certificar da habilitação que cada uma dessas empresas deve possuir para poder satisfazer o edital e, por conseguinte, apresentar suas propostas na sessão licitatória.

c) A habilitação constitui, por evidente, uma fase importante em qualquer certame. No particular da terceirização, a mesma assume papel extremamente relevante, na medida em que devemos aferir com profundidade os aspectos ligados principalmente à idoneidade da futura contratada com relação à sua estruturação econômico-financeira e à sua situação fiscal e tributária. Relembre-se, ainda quanto ao presente aspecto, que a contratada deverá justamente reunir suporte suficiente para responder pelos ônus da responsabilidade (objetiva, independente de demonstração de culpa) prevista no art. 37, § 6º da Constituição Federal, os quais, se não atendidos pela “terceirizada”, podem acabar por incidir sobre a própria Administração (culpa in eligendo e/ou in vigilando).

d) A exigência de garantias (já no instrumento convocatório - art. 56 da Lei nº 8.666) de modo a se assegurar não apenas a execução do objeto contratual, mas também de todos os consectários inerentes ao mesmo ajuste.

e) A definição de claros parâmetros para o exercício da fiscalização, por parte da Administração, sobre os serviços prestados. Há de se dispor de elementos objetivos para a aferição/quantificação de tais serviços e da adequação dos mesmos aos padrões de qualidade previamente exigidos. A atividade de gestão afeta ao Município, pois, mostra-se da maior relevância, sempre travada toda e qualquer relação entre as entidades contratantes, sem que a Administração Púbica possa ditar comandos ou fazer exigências diretamente ao pessoal vinculado à prestadora.

f) Assim, no mesmo sentido, não se pode construir qualquer relação de subordinação entre os agentes, o pessoal da “terceirizada” e a Administração, devendo esta zelar para que o contrato seja cumprido nos termos avençados, adotando as providências pertinentes à fiel observância do contrato, buscando sempre e unicamente a “execução material” dos serviços, nos moldes previamente definidos.

g) As fases de liquidação e pagamento das despesas devem atentar não apenas para a correta execução dos serviços, mas também há de se exigir da contratada a demonstração da regularidade da mesma ante os encargos sociais (esclarecendo que, em relação às sociedades cooperativas não se estabelece liame de caráter empregatício entre o associado e sua cooperativa). Além disso, em face do estatuído no art. 71, § 2º da Lei nº 8.666 (com as alterações ditadas na Lei nº 9.032) a responsabilidade pelas obrigações previdenciárias, quando não pagas pelo contratado, transfere-se ao poder público. Lembrando também que, à luz do art. 37, § 4º da Constituição Federal e das Leis Federais nºs 7.347 (ação civil pública); 4.717 (ação popular) e 8.429 (definindo os atos de improbidade administrativa), o administrador danoso e, sobretudo, o que ordenar despesas em tal contexto precárias, ou não quitar as obrigações e encargos socais da prestação destes serviços, pode ser responsabilizado administrativa, civil e criminalmente.

h) Ao lado de todos esses aspectos, e reiterando o que já dissemos, nunca se pode perder de mira que a terceirização deve se justificar, além de tudo, também em face da sua capacidade de preservar o princípio da economicidade. Se à terceirização não se aliar necessariamente esse aspecto, desaparece aquele que é um dos principais argumentos que levantam seus defensores. Não que se possa fundir aqui todos os seus elementos motivadores, posto que não seriam suficientes, mas sem ele parece grave equívoco qualquer processo assim desencadeado.

É por isso também que em nenhum momento se justificaria afastar, submeter à disponibilidade ou mesmo ao ócio os quadros funcionais já existentes para ir à busca dos serviços de terceiros, já aí não se ferindo apenas o valor da economicidade, mas ainda também o princípio da moralidade e até a própria finalidade pública, pois o que se busca com isso não é o desperdício ou a desocupação daqueles que tem o dever público, mas sim, a melhoria da eficiência, com eficácia e economicidade para a Administração Pública.



3.2 Os serviços passivos de terceirização na Administração Pública


De plano poder-se-ia questionar quais as atividades seriam passíveis de terceirização. O exame, no entanto, no tocante a matéria reverte o questionamento à luz da legislação determinando-se, sim, a inversão da questão e perguntando "o que não se pode terceirizar?". No campo dos serviços públicos essa possibilidade ficou bem ampliada com o Decreto nº 2.271, de 7/7/97, como já se afirmou anteriormente, que fixou as seguintes atividades:
a) a terceirização de serviços de conservação;
b) a terceirização de serviços de limpeza;
c) a terceirização de serviços de segurança;
d) a terceirização de serviços de transportes;
e) a terceirização de serviços de informática;
f) a terceirização de serviços de copeiragem;
g) a terceirização de serviços de recepção;
h) a terceirização de serviços de reprografia;
i) a terceirização de serviços de telecomunicação;
j) a terceirização de serviços de manutenção de prédios;
k) a terceirização de serviços de manutenção de equipamentos; e
l) a terceirização de serviços de instalação.

Necessário tamém não esquecer de mencionar nesse estudo que a Constituição Federal incentiva o cooperativismo pelo seu art. 3º, I, afirmando ser objeto fundamental da República a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, e o incentiva, ainda, pelo art. 174, § 2º, estatuindo que “A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo;” e pelo art. 5º, caput, c/c item XVIII, pelos quais “Todos são iguais perante lei, garantindo-se (...) a criação de associações e cooperativas, vedada a interferência estatal em seu funcionamento”.

Assinale-se ainda, que não há vedação expressa na Lei 8.666/93, bem como na Lei 5764/71, quanto a celebração de contrato administrativo entre o Poder Público e uma cooperativa. Por isso, reafirme-se neste sentido, que a terceirização só pode ser efetuada através de contrato e não de convênio, posto ser este último um instrumento de cooperação técnica e administrativa, no qual os interesses dos convenientes são comuns.
3.3 Terceirização de Serviços de Educação

Em termos genéricos e resguardadas as normas constitucionais próprias, pode-se afirmar que boa parte do que será referido com respeito à prestação dos serviços de saúde pública também se aplica à educação. O art. 209 da Constituição dispõe que “o ensino é livre à iniciativa privada”. Assim, sendo serviço público, temos que se trata por alcançar a toda a coletividade, mas não se constitui em atividade privativa da Administração Pública, sendo prestado também por instituições privadas, portanto, a possibilidade de terceirização do serviço em certos aspectos.

Ensina a Profª SILVIA DI PIETRO: “Quando prestado pelo Estado, como serviço público, a Constituição, no art. 206, inciso VI, coloca como princípio de observância obrigatória, o da ‘gestão democrática do ensino público, na forma da lei’; gestão democrática significa a participação do particular na gestão e não a transferência da gestão ao particular. Desse modo, também está afastada a terceirização do serviço de ensino como um todo, pela transferência, a terceiros, de sua gestão operacional.”

Por outro lado, quando se trata da educação como serviço público impróprio, prestado por particular, pode o Estado aportar recursos, desde que atendidos os requisitos constantes do art. 213 da Constituição Federal. Ainda na esteira desse pensamento, em tais hipóteses, verifica-se que o Estado não oferece propriamente um serviço público de ensino, mas unicamente exercita uma atividade de fomento. Quer dizer: precipuamente incentiva a atividade de interesse público exercida por ação do particular.


4. DA TERCEIRIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DE SAÚDE NA ADMINISTRAÇÃO PÚBICA

Mais especificamente na área da saúde, ao longos dos últimos anos, a Administração Pública Municipal viu a criação e o crescimento de um problema que vinha se agravando e que chegou ao ponto de exigir uma reação urgente dos atuais gestores.

Trata-se da necessidade de amparar a enorme demanda junto a população por intermédio do Sistema Único de Saúde (SUS). O serviço de saúde, agora municipalizado, contraiu para os municípios enorme responsabilidade e, acima de tudo, presteza, eis que, se de um lado a população clama por um atendimento digno e eficaz, seus administradores vêm-se às voltas para atender a enorme demanda junto a escassa linha de frente, formada por médicos, odontólogos, enfermeiros, entre outros profissionais do ramo.

A saúde não é serviço público que demanda execução direta, eis que a própria Constituição Federal previu a colaboração da iniciativa privada. A transferência de serviços para terceiros, inclusive no âmbito da administração pública, constitui hoje, em nível mundial, uma marca de "modernidade" e de "competitividade". Sua prática nasceu nos Estados Unidos e consolidou-se nos anos 50. O setor que mais terceirizou foi a indústria. No Brasil foram as multinacionais de automóveis que trouxeram este modelo.

A concepção do modelo consiste basicamente no seguinte raciocínio: é preciso, para ser eficiente e poder estar no mercado com preços de concorrência, concentrar-se nas atividades fins, ou seja, no objetivo (grifo nosso), que é a produção e transferir, para outras instâncias de execução os meio necessários. denominação do termo "terceirização" .

Entendo o caso desde sua base legal no ordenamento jurídico, vemos que para o exercício da atividade pública, a Constituição Federal estabelece, como regra geral para ingresso, o concurso público, excetuado apenas os casos de livre exoneração, para cargos de direção ou assessoramento. Isto porque assim preceitua o artigo 37 da Constituição Federal:
“Art. 37
(...)
II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;” (redação dada ao inciso pela Emenda Constitucional nº 19/98)

O mandamento constitucional, para o administrador público, transparece, à primeira vista, como um óbice à contratação de empresas interessadas a oferecer serviços, principalmente na área de saúde, para entes interessados. Isso porque, de início, poder-se-ia estabelecer que as Secretarias de Saúde poderiam realizar Concurso Público para ingresso nas suas carreiras e, assim, formar seu quadro próprio de profissionais.

Entretanto, senhores Gestores, como bem sabem, ocorre que esta alternativa tornar-se-ia inviável face a dois requisitos inerentes a legislação vigente:

a) A impossibilidade do incremento do quadro de pessoal face a nova Lei de Responsabilidade Fiscal (Lc. 101/2000)

b) A baixa remuneração hoje paga pelos cofres públicos, que desestimula o exercício da função destes profissionais ante a inexistência, em grande parte dos municípios, de um atrativo "plano de carreira".

Isso, é claro, sem contar com o fato de que, nos municípios pequenos, distantes dos grandes centros urbanos, os problemas são ainda maiores, face a escassa capacidade técnica, pessoal e instrumental, sem contar seus acessos, muitas vezes por estradas esburacadas e sem asfalto, contribuindo assim para diminuir a ambição de um profissional da área em prestar seu trabalho nestas localidades tão longínquas, dificultando ainda mais a prestação de um serviço, no mínimo, eficiente.

Por isso os municípios partiram para a verificação da possibilidade de contração, por meio de licitação pública, de sociedades que prestem serviços na área de saúde, complementando assim o quadro de serviços prestados pelas municipalidades. Em relação aos serviços comuns, constantes do art. 23 da Constituição Federal, entre os serviços públicos passíveis de transferência a terceiros para sua execução, se configuram:
“Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:
................................................................................
“II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;”

Assim senhores, começamos a quebrar um tabu desmitificando que a saúde não é serviço público que demanda exclusiva execução direta, eis que a própria Constituição Federal previa a colaboração de entidades sem fins lucrativos.

Dando prosseguimento a esse estudo, podemos ver que o art. 198 da Constituição da República preconiza que os serviços públicos de saúde “integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único”, a ser organizado consoante as seguintes diretrizes:

I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo;
II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;
III - participação da comunidade.

Verifica-se, de início, que a combinação do dispositivo retro com o estatuído no art. 196 da mesma Carta (“A saúde é direito de todos e dever do Estado...”) impede que essa descentralização se opere com base em concessões ou permissões, de vez que, em ambas as situações, o concessionário e o permissionário acabam remunerados não pelo poder concedente, mas pelos usuários do serviço. Assim sendo, devendo a saúde ser garantida gratuitamente à população, tal solução seria impraticável.

A própria Constituição se reporta à possibilidade de serem os serviços públicos de saúde prestados por terceiros, que não a Administração. Realmente, o arts 197 e 199, § 1º, assim preveem:
“Art. 197 – São relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao poder público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado”.

[...]

“Art. 199. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada.
“§ 1º - As instituições privadas poderão participar de forma complementar do sistema único de saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos.”

A esse respeito, diz-nos a Profª. Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

“A Constituição fala em contrato de direito público e em convênio. Com relação aos contratos, uma vez que necessariamente deve ser afastada a concessão de serviço público, por ser inadequada para esse tipo de atividade, tem-se que entender que a Constituição está permitindo a terceirização, ou seja, os contratos de prestação de serviços tendo por objeto a execução de determinadas atividades complementares aos serviços do SUS, mediante remuneração pelos cofres públicos. Trata-se dos contratos de serviços regulamentados pela Lei nº 8.883, de 8-6-94. [...] É importante realçar que a Constituição, no dispositivo citado, permite a participação de instituições privadas ‘de forma complementar’, o que afasta a possibilidade de que o contrato tenha por objeto o próprio serviço de saúde, como um todo, de tal modo que o particular assuma a gestão de determinado serviço (...). A Lei nº 8.080, de 19-9-90, que disciplina o Sistema Único de Saúde, prevê, nos arts. 24 a 26, a participação complementar, só admitindo-a quando as disponibilidades do SUS ‘forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial à população de uma determinada área’, hipótese em que a participação complementar ‘será formalizada mediante contrato ou convênio, observadas, a respeito, as normas de direito público’ (entenda-se, especialmente, a Lei nº 8.666, pertinente às licitações e contratos). Isto não significa que o Poder Público vai abrir mão da prestação do serviço que lhe incumbe para transferi-la a terceiros; ou que estes venham a administrar uma entidade pública prestadora do serviço de saúde; significa que a instituição privada, em suas próprias instalações e com seus próprios recursos humanos e materiais, vai complementar as ações e serviços de saúde, mediante contrato ou convênio. Isto tem uma justificativa; conforme dito acima, a prestação de serviço público tem que estar sempre subordinada a um regime jurídico de direito público, ainda que apenas parcialmente. Não é por outra razão que o art. 175 da Constituição estabelece que ‘incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob o regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos’. É que a concessão e a permissão são contratos tipicamente administrativos que implicam a transferência, para o particular, de poderes e prerrogativas públicas próprias do Poder Público, consideradas essenciais à prestação de qualquer tipo de serviço público... Apenas se admite a terceirização de determinadas atividades materiais ligadas ao serviço de saúde; nada mais encontra fundamento no direito positivo brasileiro.” (destaque)

Mais uma vez, insistimos em não esquecer de mencionar que a Constituição Federal incentiva o cooperativismo pelo seu art. 3º, I, afirmando ser objeto fundamental da República a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, e o incentiva, ainda, pelo art. 174, § 2º, e ainda, que não há vedação expressa na Lei 8.666/93, bem como na Lei 5764/71, quanto a celebração de contrato administrativo entre o Poder Público e uma cooperativa. Por isso, mais uma vez, nesse mesmo texto, dizemos que a terceirização só pode ser efetuada por meio de contrato e não de convênio.

E tratando-se de contrato, o mesmo deve ser precedido de licitação, na forma do art. 37, XXI, da Constituição Federal, c/c o art. 2º da 8.666/93, sendo normalmente Concorrência ou Pregão, podendo esta ser dispensada, nos moldes do art.24, V, da citada Lei, quando não acudirem interessados.

De forma local, vejamos o exemplo da Constituição Estadual do Rio Grande do Sul permite tal contratação apenas impedindo que o exercício de determinadas atividades (essenciais) sejam objeto de monopólio privado:
Art. 163 - Incumbe ao Estado a prestação de serviços públicos, diretamente ou, através de licitação, sob regime de concessão ou permissão, devendo garantir-lhes a qualidade. (...)
§ 2º - Os serviços públicos considerados essenciais não poderão ser objeto de monopólio privado.
Outro ponto onde reside fundamentos a tal tipo de contratação é a observância do "Princípio da Economicidade" e, por que não dizer da "eficiência" anexado à Constituição Federal através de emenda, e que norteiam a administração pública.
Há um parecer já exarado pelo Tribunal de Contas Gaúcho (mais precisamente de nº 03/97) que assim mencionava: " O desafio do direito público é fazer com que, dentro da lei o interesse da coletividade seja melhor atendido, (grifo nosso) através da prestação de serviços eficientes, mais ágeis e menos onerosos aos cofres públicos (em outras palavras, aos cidadãos)."
Todavia estes profissionais contratados, embora regidos por um estatuto do qual são oriundos, estão sob comando da Secretaria de Saúde correspondente ou afim, e deverão acatar determinações do órgão contratante, pois é para este que prestam o serviço.
Por outro lado, merece também referência a forma pelo qual dará esta contratação junto ao Poder Público. A lei federal nº 8.080/90, que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes, em seus art. 20 a 26 estabelece:

TÍTULO III
DOS SERVIÇOS PRIVADOS DE ASSISTÊNCIA Á SAÚDE
CAPÍTULO I
Do Funcionamento
Art. 20. Os serviços privados de assistência à saúde caracterizam-se pela atuação, por iniciativa própria, de profissionais liberais, legalmente habilitados, e de pessoas jurídicas de direito privado na promoção, proteção e recuperação da saúde.
Art. 21. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada.
Art. 22. Na prestação de serviços privados de assistência à saúde, serão observados os princípios éticos e as normas expedidas pelo órgão de direção do Sistema Único de Saúde (SUS) quanto às condições para seu funcionamento.
Art. 23. É vedada a participação direta ou indireta de empresas ou de capitais estrangeiros na assistência à saúde, salvo através de doações de organismos internacionais vinculados à Organização das Nações Unidas, de entidades de cooperação técnica e de financiamento e empréstimos.
§ 1º Em qualquer caso é obrigatória a autorização do órgão de direção nacional do Sistema Único de Saúde (SUS), submetendo-se a seu controle as atividades que forem desenvolvidas e os instrumentos que forem firmados.
§ 2º Excetuam-se do disposto neste artigo os serviços de saúde mantidos, em finalidade lucrativa, por empresas, para atendimento de seus empregados e dependentes, sem qualquer ônus para a seguridade social.
CAPÍTULO II
Da Participação Complementar
Art. 24. Quando as suas disponibilidades forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial à população de uma determinada área, o Sistema Único de Saúde (SUS) poderá recorrer aos serviços ofertados pela iniciativa privada.
Parágrafo único. A participação complementar dos serviços privados será formalizada mediante contrato ou convênio, observadas, a respeito, as normas de direito público.
No entanto, reiteramos que este procedimento deverá ser iniciado a partir da realização de um certame licitatório, visando, assim, assegurar a publicidade deste ato e garantir, assim, a oferta de inúmeras propostas ao poder público e, ser escolhida a mais vantajosa, de acordo com o artigo 3º da Lei nº 8.666/93.


4.1 Do entendimento de algumas Cortes de Contas

E tendo em vista as notórias deficiências na área de saúde pública, além da observância do princípio da eficiência, consagrado no art. 37, caput, da Constituição Federal, o Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Ceará proferiu a decisão nº 0001/99, Relator Cons. Pedro Ângelo, repetida no PROCESSO No 5702/01, INFORMAÇÃO No 113/01, sob consulta formulada pela Prefeitura Municipal de SABOEIRO – CE, cuja ementa é a seguinte:

· Terceirização. Contratação de cooperativas para execução de serviços de saúde.
· Admissão expressa na Constituição, art. 197.
· Os Serviços de Saúde, de natureza essencial, próprios do Poder Público, podem ter, de forma complementar, sua execução, delegada ao setor privado, observada sempre a regulamentação, a fiscalização e o controle do Estado.

No corpo dessa decisão, lê-se:
“Mas a terceirização vem como forma complementar nas ações de saúde pública. Não pode o Estado terceirizar o “todo”, como ocorreu em relação aos serviços de administração de uma Prefeitura de Minas Gerais (“Correio do Povo”, pg.2. ed.05-4-97, citado por Miola).

A respeito do modus faciendi da terceirização, a Profa. Sylvia Di Pietro diz que a Constituição fala em contrato de direito público e em convênio, e O Tribunal de Contas cearense se utiliza do mesmo trecho de sua obra que já foi citado neste artigo, até por ser uma referência de grande notoriedade.

Assim, com a devida vênia, atrevemo-nos a complementar esse raciocínio com uma menção à Lei 8080/90, que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e funcionamento dos serviços correspondentes, regulamentando, em todo o território nacional, as ações e serviços de saúde executados isolada ou conjuntamente, em caráter permanente ou eventual, por pessoas físicas ou jurídicas de direito público ou privado, e reafirmando que a saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.

Diversificando as fontes de opiniões desse estudo, temos que, por sua vez, no Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul, o tema mereceu laborioso trabalho, sob o título: “A Terceirização no Serviço Público”, também de autoria de Cezar Miola – Procurador do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul, em auxílio ao Programa de Orientação às Administrações Públicas, promovido pelo TCE/RS, constituindo-se valiosa referência ao assunto, porquanto amplia o debate em torno da terceirização de serviços públicos.

E no sentido que estava sendo tratado aqui, o professor gaúcho fecha a discussão com o seu entendimento publicado em um de seus artigos no Portal daquele órgão, chamando atenção para o princípio constitucional basilar, sobretudo na Administração Pública: a RAZOABILIDADE. E assim arremata:

“O interesse público não tem, necessariamente, como sinônimo, a atuação privativa da Administração, incumbindo a esta, precipuamente, ser a grande catalizadora, a gestora das práticas de interesse comum, afastada a conduta paternalista e solidificando-se sua atuação ética e socialmente comprometida, sem necessariamente ser exclusiva.”

Em prosseguimento a essa argumentação, valemo-nos da pesquisa destacada do excelente trabalho “TERCEIRIZAÇÃO DE SERVIÇOS VIA COOPERATIVA DE TRABALHO - CONSTITUCIONALIDADE E LEGALIDADE – de Vergilio Frederico Perius, Professor da UNISINOS e Auditor Substituto de Conselheiro do Tribunal de Contas/RS (aposentado), a quem agradecemos essa valorosa contribuição ao Direito Administrativo, demonstrando que a Auditoria da Corte de Contas do Rio Grande do Sul, há muito, vem tratando a matéria da seguinte forma:

a) Parecer nº 233/94 (19-05-94), tendo como Relatora Heloisa Tripoli Goulart Piccinini, cuja ementa reza:

“Terceirização de serviços de recebimento, armazenagem e beneficiamento de grãos. Consulta. Município de Independência. Opções. Criação de entidade paraestatal, através de lei específica, com forma adequada à finalidade a que se destina. Contratação de concessão de serviços de administração. Observância dos preceitos da Lei nº 8.666/93.”

b) Parecer nº 452/94 (18-11-94), tendo como Relator Wremyr Scliar, cuja ementa assim se expressa:
“Contrato de prestação de serviços celebrado com terceiro. Solicitação de esclarecimentos. Inspetoria Regional de Caxias do Sul. Parecer nº 262/94, da Auditoria. Singularidade do instrumento. Especialização. Comprometimento tributário. Serviços públicos indisponíveis e indelegáveis. Parecer nº 72/93, da Auditoria, Reexame de matéria. Caso concreto.”

c) Parecer nº 3/97, sendo Relator Vergilio Perius, assim ementado:

“Terceirização. Consulta. Prefeitura Municipal de Ibirubá-RS. - Terceirização de serviços públicos. Inteligência de normas constitucionais e legais sobre a matéria. Doutrina e Jurisprudência. Conceituação. Estudos e análises no âmbito desse Tribunal de Contas. Os Pareceres nºs 262/94, 327/94 e 452/94, acolhidos pelo Tribunal Pleno. O Parecer n° 233/94. Legislação pertinente à matéria. Legalidade de terceirização dos serviços, objeto da consulta, mediante realização de contrato, condicionada ao procedimento licitatório, autorização legal e fiscalização dos serviços.”

d) Parecer nº 47/2001, sendo Relator Vergilio Perius, assim ementado:
“Terceirização de serviços públicos. Consulta. Prefeitura Municipal de Cruz Alta - RS. Atividades de execução indireta (terceirização) face a Lei de Responsabilidade Fiscal. Exclusão dos limites de gastos com pessoal. Convalidação do Parecer Coletivo nº 3/97 e dos Pareceres nºs 69/2000 e 73/2000. Conclusões.”

Outro estudo sobre o tema, intitulado “A Administração Pública e as Cooperativas de Trabalho”, também da autoria do Prof. Vergilio Perius, enfoca a questão da terceirização via Cooperativas de Trabalho, entendendo como forma jurídica mais aperfeiçoada da terceirização, na medida em que a proposta cooperativada, quando bem organizada, consegue beneficiar melhor tanto o tomador dos serviços, como o trabalhador, associado à cooperativa (Revista do Tribunal de Contas-RS, Ano XIV, nº 25, 2º Semestre de 1996, p. 187).

Também encontramos importantes registros de consultas e discussões a respeito deste tema no Tribunal de Contas do Estado do Paraná, extraídos de um Estudo intitulado TERCEIRIZAÇÃO DA EXECUÇÃO DE PROGRAMAS FEDERAIS DE SAÚDE, de autoria do ilustre Advogado Paranaense Sidnei Di Bacco. A jurisprudência da Corte é vacilante a respeito do assunto, mas, com restrições, admite a terceirização de programas federais de saúde, através da contratação de:

a) Cooperativas de trabalho: consulta do município de Irati, processo n. 137050/02, Resolução n. 3521/03.
b) Empresas de terceirização de serviços: consulta do município de Nova Santa Bárbara, processo n. 312735/03, Resolução n. 7555/03.

As atividades que os municípios pretendem terceirizar geralmente são executadas pelos seguintes profissionais de saúde: médico (nível superior), enfermeiro (nível superior), dentista (nível superior), auxiliar de enfermagem (nível de 2º grau) e agente comunitário de saúde (nível de 1º grau, Lei n. 10.507/02).


4.2 Do entendimento do Direito do Trabalho

No âmbito do Direito do Trabalho, verifica-se que o tratamento dado à matéria é dos mais diversos. Países como a Suécia e Espanha a proíbem expressamente. Noutros há norma para tal (Bélgica, Dinamarca, Noruega).

Por outro lado, também há países que consentem com a mesma, sem que disponham de diplomas normativos próprios (Grã- Bretanha, Suíça, Irlanda e Luxemburgo). Quando o tema é a terceirização de serviços, uma das mais abalizadas vozes a ser ouvida é novamente a do Prof. Sérgio Pinto MARTINS, em seu Curso de Direito do Trabalho. Vale que se reproduzam alguns dos seus principais argumentos:

“A terceirização é um fenômeno que se apresenta com maior ou menor intensidade em quase todos os países. Num mundo que tende para a especialização em todas as áreas, gera a terceirização novos empregos e novas empresas, desverticalizando-as para que possam exercer apenas a atividade a que se aprimoraram, delegando a terceiros a possibilidade de fazer serviços em que não se especializaram.”

Assim sendo, sempre que se tratar da contratação de empresas prestadoras de serviços, reveste-se de especial importância o ato de liquidação da despesa por parte da Administração (art. 63 da Lei Fed. nº 4.320/64). Com isso, ao se processar a liquidação e o pagamento dos valores ajustados, há de se obter a comprovação com respeito à regularidade da situação da empresa terceirizada com relação àquelas obrigações, sob pena mesmo de responsabilização de quem der ensejo ao pagamento sem tais cautelas.

Aduza-se, ainda a propósito, o que estabelece o art. 67 da Lei nº 8.666:

“A execução do contrato deverá ser acompanhada por um representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição”.

E partindo-se da Lei Fundamental invocadora da Lei 8.666/2003, verifica-se que no art. 37, inc. XXI encontra-se prevista a possibilidade de virem os entes públicos (da Administração direta e indireta) a contratarem serviços. Muito antes porém, ainda em 1967, através do Decreto-Lei nº 200 (25-02-67), já se previa que a Administração poderia se desincumbir de determinadas tarefas executivas através da execução indireta. Tudo já inserido numa proposta que há três décadas não apenas dava o grande passo em direção à modernização e reforma do Estado, como também, de algum modo, antecipava uma realidade muito presente nos dias atuais.

Inserto no capítulo III (Da Descentralização), dispõe o art. 10 do Decreto-Lei nº 200: “Art. 10. A execução das atividades da Administração Federal deverá ser amplamente descentralizada. [...] § 7º Para melhor desincumbir-se das tarefas de planejamento, coordenação, supervisão e controle e com o objetivo de impedir o crescimento desmesurado da máquina administrativa, a Administração procurará desobrigar-se da realização material das tarefas executivas, recorrendo, sempre que possível, à execução indireta, mediante contrato, desde que exista, na área, iniciativa privada suficientemente desenvolvida e capacitada a desempenhar os encargos de execução”.

Mesmo que editado à luz do ordenamento constitucional pretérito, não parece errado considerar que, no particular, o mencionado texto legal se afina com outros primados constitucionais, que compreendem a própria modelagem como se estrutura a ordem econômica do País, onde a atuação do Estado não tolhe como mesmo estimula a atividade privada.

Assim sendo, para finalmente ilustrar essa argumentação, comprovando todas as idéias aqui descritas com fatos, trazemos recentes decisões emanadas do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da Quarta Região, fundamentadas na Lei nº 5.764/71 e na Lei nº 8.949/94, conferindo legalidade às Cooperativas de Trabalho e afastando a pretensão de vínculo empregatício:

"RECURSO ORDINÁRIO E REEXAME NECESSÁRIO. COOTRAVIPA. Hipótese em que o demandante, por expressa vedação legal, não é empregado do Departamento Municipal de Limpeza Urbana, mas associado da cooperativa. Inteligência dos artigos 442, parágrafo único, da CLT, e 90 da Lei nº 5764/71, segundo os quais a prestação de serviços por trabalhador autônomo, na qualidade de sócio cooperativado, não gera vínculo de emprego com a cooperativa a que se encontra filiado, nem com o tomador de serviços." (1ª Turma do TRT da 4ª Região, REO/RO 00499.018/98-2.Juiz Relator: LEONARDO MEURER BRASIL. Data da publicação: 15.07.2002)


“MÉRITO.ANÁLISE CONJUNTA. RECURSO ORDINÁRIO DA PRIMEIRA RECLAMADA. REEXAME NECESSÁRIO. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. VERBAS DECORRENTES. A primeira reclamada busca a reforma da decisão que reconheceu o vínculo de emprego e a condenou, solidariamente com o segundo reclamado, a proceder a anotação da CTPS da reclamante, no período de 31-03-98 a 31-05-01, bem como ao pagamento das verbas decorrentes. Merece reforma a decisão. Na medida que o reclamante busca, na inicial, o reconhecimento do vínculo de emprego com os reclamados, no período de 31-03-98 a 31-05-01, na função de merendeira (item 01, fl. 02 e pedido a, fl. 05) e estes admitem a prestação dos serviços, no período alegado, (defesas das fls. 18/22 e 91/94), sustentando, como fato impeditivo do direito pleiteado, a condição da obreira de empregada/associada da primeira reclamada, Cooperativa Mista dos Trabalhadores Temporários do Alto Uruguai Ltda - COOMTTAU, com a qual manteve contrato de prestação de serviços, cabia aos demandados o ônus de comprovarem suas alegações, do qual se desincumbiram. Com efeito, a primeira demandada traz aos autos o contrato administrativo nº 02/98 das fls. 59/65, e aditivo da fl. 66, comprovando desta forma, que efetivamente celebrou o aludido contrato de prestação de serviços de mão-de-obra com o Município mencionado. Ainda, vêm aos autos, cópia do Estatuto Social (fls. 26/40), atas de assembléias da cooperativa (fls. 41/58), proposta de sócio (fl. 23), ficha de adesão (fl. 24), ficha de matrícula (fl. 25), comprovantes de retirada de sócio (fls. 67/81) e guias de recolhimento de contribuinte individual do INSS - GRCI (fls. 82/87), documentos que demonstram que a mão-de-obra prestada pela reclamante era intermediada pela cooperativa reclamada. Diante de tal contexto probatório, não se sustenta a decisão original, que entendeu haver fraude à legislação trabalhista, a atrair a incidência do art. 9º da CLT, autorizando a conclusão de que houve relação de trabalho nos moldes do vínculo de emprego, entre os reclamados e a reclamante. Isso porque não restou demonstrada a presença dos elementos caracterizadores da relação de emprego, elencados no art. 3º da CLT, na integralidade, já que ausentes a subordinação jurídica e a onerosidade. Ainda que assim não fosse, revela-se equivocada a sentença hostilizada, na medida que não há amparo legal para a condenação de ente público ao pagamento de indenizações decorrentes de relação de trabalho, que não sejam as correspondentes aos dias efetivamente trabalhados. Neste sentido é o entendimento emanado do Enunciado nº 363 do C. TST, in verbis: "A contratação de servidor público, após a Constituição Federal de 1988, sem prévia autorização em concurso público, encontra óbice no seu art. 37, II, e § 2º, somente conferindo-lhe direito ao pagamento dos dias efetivamente trabalhados, segundo a contraprestação pactuada em relação ao número de horas trabalhadas, respeitado o salário-mínimo/hora" (redação determinada pela Resolução nº 111/00, de 04-04-02). Por todo o exposto, dá-se provimento ao recurso ordinário da primeira reclamada, para absolvê-la da condenação imposta, decidindo-se da mesma forma em reexame necessário. Registra-se, por oportuno, que restando afastada a condenação principal, não há falar em responsabilidade solidária do segundo reclamado.” (REO/RO/00885.521/01-3)

"COOPERATIVA DE TRABALHO. Forma de cooperativismo que tenta responder de forma social e humana à toda a desestruturação que o capitalismo e agora o neo-liberalismo vêm provocando através da chamada globalização da economia. Entretanto, pela sua repercussão e conseqüências atuais sobre o Direito do Trabalho, conflitam, em princípio apenas, com importantes princípios, como aquele da proteção social do hiposuficiente consagrado na vigente Constituição Federal. As cooperativas de trabalhadores, todavia e por certo, não pretendem renunciar às conquistas históricas dos obreiros, que por muitos anos foram penalizados com jornadas de trabalho aviltantes, salários irrisórios, condições de trabalho precárias e insalubres, e sem nenhuma garantia de um futuro razoável, em hipótese de acidente ou doença. Essas cooperativas de trabalho ou as empresas de trabalho associado tornaram-se uma alternativa à disposição do desempregado, como forma de contornar os problemas de geração de renda. Relação de emprego que, no caso concreto, não se considera existente, mantendo-se a decisão de origem.” (RO-00652-611/99-0)

E, por sua vez, trazemos ao presente trabalho alguns acórdãos relativos à inexistência de vinculo trabalhista com fundamento na Lei nº 5.764/71:

“As Cooperativas igualam-se às demais empresas em relação aos seus empregados, mas, em se tratando de associados ou cooperados, participando dos lucros e dos prejuízos na forma dos estatutos, tendo vez e voto nas assembléias, não há como se ter presente na hipótese uma relação empregatícia (TRT – 6ª Região – Proc. 640/78).”

"COOPERATIVA DE TRABALHADORES. VÍNCULO ENTRE O ASSOCIADO E A COOPERATIVA. A prova demonstra que a A. era sócia da cooperativa e não empregada da mesma, nos termos da Lei nº 5.764/71 e do Estatuto Social daquela entidade. Incidem, portanto, os artigos 90 da Lei nº 5.764/71 e 442, parágrafo único da CLT." (01320.018/97-1 (REO/RO) Juíza Relatora: VANIA CUNHA MATTOS Data de Publicação: 09/10/2000)

"VÍNCULO DE EMPREGO. ASSOCIADOS DE COOPERATIVA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. Entende-se que Lei nº 8.949/94, ao acrescentar o parágrafo único ao art. 442 da Consolidação, definiu não obstante o ramo de atividade da sociedade cooperativa, inexiste vínculo empregatício entre ela e seus associados, nem entre estes e os tomadores de serviços daquela. As cooperativas prestam importantes serviços a seus associados, pois embora não se configure o vínculo de emprego e dos direitos daí decorrentes, é incontestável que os trabalhadores têm assegurado trabalho e por estes serviços, recebem a paga correspondente, minimizando a precária situação enfrentada pelo alto índice de desemprego existente neste contexto social, não podendo as mesmas serem punidas com encargos trabalhistas alheios ao disposto em seu contrato social. Recurso provido." (RO 00773.641/97-1 - 5ª TURMA do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, Juiz Relator: LEONARDO MEURER BRASIL Data de Publicação27/09/1999)

"SÓCIO COOPERATIVADO. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO DE EMPREGO COM A TOMADORA DE SERVIÇOS (COTRICAMPO). Consoante o estatuído no artigo 90 da Lei 5764/71, a prestação de serviços por trabalhador autônomo sócio cooperativado não gera vínculo de emprego, não apenas e entre a cooperativa e seus associados, como também com os tomadores de serviços daquela." (00228.641/99-3 (RO) 2ª Turma do TRT da 4ª Região, Juíza Relatora REJANE SOUZA PEDRA. Data de publicação: 02.04.2001)

“Relação de Emprego – Cooperativa de Prestação de Serviços Autônomos – Constituição regular, na forma da Lei n. 5.764/71, cuja atividade precípua dos cooperativados é prestar serviços a terceiros. Ausência de vínculo empregatício, porque o Autor foi nela integrado como associado, e o contexto probatório dos autos não condiz a outro entendimento: os serviços prestados ao DMLU decorrem unicamente da sua condição de associado autônomo da Cootravipa, cuja estrutura e funcionamento eram do conhecimento do reclamante. [...] Verifica-se pois que a Cootravipa encontra-se devidamente constituída na forma da Lei n. 5.764/71, dispondo, em seus estatutos, sobre as atividades pelas quais foi constituída, voltada precipuamente ao atendimento dos interesses dos cooperativados, segundo seus atos constitutivos. Não configura ofensa às leis trabalhistas a prestação de serviços a terceiros com os quais a Cootravipa contratava, por ser esse exatamente seu objetivo principal (TRT – 4ª Região – RO 93.028693-6 – 2ª Turma – Rel. J. Luiz Caldas Milano – Sessão de 29/11/94 – DJE 16/1/95).”

“Relação de Emprego – Cooperativa – A reclamante, na qualidade de autônoma, tinha inscrição junto à previdência social, sendo associada à Cooperativa licitamente constituída, com integralização de capital à mesma. Vínculo empregatício não reconhecido. Recurso provido (TRT – 4ª Região – RO 94.29974-7 – 1ª Turma – Rel. J. Edir Inácio da Silva – Sessão de 29/11/95 – DJE 8/1/96).”

Após a coleção de uma série de decisões que demonstram a inexistência de vínculo empregatício com o tomador de serviço, principalmente quando se trata de pessoa jurídica de direito público, e ainda



5. NATUREZA FINANCEIRA DAS DESPESAS COM TERCEIRIZAÇÃO DE SERVIÇOS - OBRIGATÓRIA DE CARÁTER CONTINUADO – NÃO ENQUADRAMENTO COM OUTRAS DESPESAS DE PESSOAL

Quanto ao pagamento de tais despesas ressaltamos que, se a contratação em questão for caracterizada como terceirização de mão-de-obra, o pagamento será incluído no limite de gastos com pessoal, conforme disposto no art. 18 da Lei de Responsabilidade Fiscal, bem como no art. 15, parágrafo único, da Instrução Normativa nº 03/00, desta Corte de Contas. Caso contrário, se for contratação de prestação de serviços de terceiros, tais gastos deverão atender ao percentual mencionado no art. 72 da LRF, segundo o art.16 da referida Instrução.
A Lei Complementar nº 101/2000 – Lei de Responsabilidade Fiscal – que regulamentou o art. 169 da Constituição da República, impõe limite de gastos com pessoal na Administração Pública, com o objetivo de tentar conter artifícios que comprometam o equilíbrio das contas públicas. Para tanto, foi determinada pela Lei a inclusão, no limite de gastos com despesas de pessoal, as contratações de serviços terceirizados. Observe:
Art. 18. Para os efeitos desta Lei Complementar, entende-se como despesa total com pessoal: o somatório dos gastos do ente da Federação com os ativos, os inativos e os pensionistas, relativos a mandatos eletivos, cargos, funções ou empregos, civis, militares e de membros de Poder, com quaisquer espécies remuneratórias, tais como vencimentos e vantagens, fixas e variáveis, subsídios, proventos da aposentadoria, reformas e pensões, inclusive adicionais, gratificações, horas extras e vantagens pessoais de qualquer natureza, bem como encargos sociais e contribuições recolhidas pelo ente às entidades de previdência.
§ 1º. Os valores dos contratos de terceirização de mão-de-obra que se referem à substituição de servidores e empregados públicos, serão contabilizados como ‘Outras Despesas de Pessoal’.

O art. 19 do diploma legal citado estabelece ainda que cada ente da Federação não poderá gastar com pessoal valores que superem 50% (cinqüenta por cento), para a União e 60% (sessenta por cento), no caso dos Estados e Municípios, da respectiva receita corrente líquida.

Desta forma, a decisão de contratar serviços terceirizados deve obediência ao artigo supracitado, ou seja, os contratos de terceirização de mão-de-obra, referentes à substituição de servidores serão incluídos no limite de gastos com pessoal. Quando o artigo 18, § 1º da Lei de Responsabilidade Fiscal fala em “serviço”, este deve ser interpretado em sentido amplo, ou seja, como atividade destinada a obter determinada utilidade de interesse para a Administração, nos moldes do art. 6º, II da Lei nº 8.666/93.

Quais são, desta forma, os ajustes que representam substituição de servidores? Conforme exposto anteriormente, a contratação de serviços de terceiros, é admissível para atividades auxiliares e complementares da administração pública, tendo como fundamento o artigo 10º, § 7º do Decreto-lei nº 200/67, assim como os artigos 6º, II; 10, II e 13 da Lei nº 8.666/93, combinados com o artigo 3º da Lei nº 5.645/70, que elenca alguns serviços tais como conservação, transporte, conservação dentre outros. Nestes casos, os serviços a serem executados são complementares às atividades-fim, desde que não possuam correspondentes efetivos na estrutura de cargos e salários.

Assim, uma vez não sendo considerada uma substituição a servidor público, não entrariam nos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Observe, nesta linha, o que estabelece o art. 61 da Lei 10.266/01, aplicável à União Federal, interpretando o art. 18, § 1º da LRF:

Art. 61. O disposto no § 1º do art. 18 da LC 101 de 2000, aplica-se exclusivamente para fins de cálculo do limite da despesa total com pessoal, independentemente da legalidade ou validade dos contratos. Parágrafo único. Não se considera como substituição de servidores e empregados públicos, para efeito do caput, os contratos de terceirização relativos a execução indireta de atividades que, simultaneamente:
I. sejam acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituem área de competência legal do órgão ou entidade, na forma do regulamento;
II. não sejam inerentes a categorias funcionais abrangidas por plano de cargos do quadro de pessoal do órgão ou entidade, salvo expressa disposição legal em contrário, ou quando se tratar de cargo ou categoria extinto, total ou parcialmente.
III. não caracterizem relação direta de emprego

Portanto, vamos aqui aos detalhes das saídas para superar o impasse do limite de contratação de pessoal, segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal, onde se verifica comumente que não se trata de “terceirização de mão-de-obra” (art. 18, § 1º, 1ª parte, LRF) e sim de “terceirização de serviços”. Pois esta distinção pode ser delineada, resumidamente, da seguinte forma:
Terceirização de mão-de-obra:
a) os empregados da contratada (prestadora de trabalho) subordinam-se à contratante (tomadora de trabalho);
b) os empregados da contratada executam atividades-fim e/ou de caráter essencial/permanente da contratante, podendo, até, substituir e/ou auxiliar empregados desta;
c) os empregados da contratada recebem a mesma remuneração dos empregados da contratante.
Exemplo: Lei n. 6.019/74, que dispõe sobre a prestação de trabalho temporário destinado a atender necessidade transitória de substituição de pessoal regular e permanente ou a acréscimo extraordinário de serviços.
Terceirização de serviços:
a) os empregados da contratada (prestadora de serviço) não se subordinam à contratante (tomadora de serviço);
b) os empregados da contratada executam atividades-meio e/ou de natureza precária da contratante;
c) não existe qualquer vinculação entre as remunerações dos empregados da contratada e dos empregados da contratante.
Exemplos: Lei n. 7.102/83 (serviços de vigilância bancária) e Decreto n. 2.271/97 (conservação, limpeza, segurança, vigilância, transportes, informática, recepção, reprografia, telecomunicações e manutenção de prédios, equipamentos e instalações).
Observa-se na terceirização de programas federais de saúde:
Subordinação: os empregados do prestador de serviço não se subordinam aos prepostos do município; os poderes hierárquicos (organização da atividade, poder de controle e poder disciplinar) são exercitados exclusivamente pelo prestador de serviço.
Precariedade: sobrevindo a extinção do convênio firmado entre o município e a União Federal, será rescindido o contrato mantido entre o município e o prestador de serviço, havendo, costumeiramente, cláusula contratual específica contendo essa hipótese de rescisão.
Substitutividade: os empregados do prestador de serviço executam trabalhos peculiares, destinados a beneficiários específicos, conforme estipulação contida no contrato firmado com o município e nos regulamentos editados pelo governo federal; a execução prescinde da participação de servidores do município; há, certamente, a presença de servidores, mas na condição de fiscais e não de executantes; inexistente, pois, a figura da “substituição de servidores e empregados públicos”.
Remuneração: não há equivalência remuneratória entre os empregados do prestador de serviço e os servidores municipais investidos em funções semelhantes.
Conclui-se, então, que:
a) inexiste identidade e/ou confusão entre as atividades exercidas pelos empregados do prestador de serviço e as tarefas desenvolvidas pelos servidores vinculados ao departamento ou secretaria municipal de saúde;
b) logo, a terceirização de programas federais de saúde constitui-se “terceirização de serviços” e NÃO de “terceirização de mão-de-obra”.
c) e que os valores, pagos pela prestação de serviços, não são incluídos nos limites de despesa com pessoal, impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal, LRF.



6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conclui-se, que a terceirização da execução de parte dos serviços de saúde pública, não é uma prática ilegal, e sim uma possível solução para o gestor público, principalmente em tempos de crise, pois diminui o custo e aumenta a qualidade dos serviços, destaca-se que o assunto deve ser visto, com responsabilidade e que apenas, parte dos serviços públicos, pode ser terceirizada conforme mencionado anteriormente. Por fim, recomenda-se que os serviços contratados sejam feitos por meio de licitação pública, conforme preceitua a lei 8.666/93.

Os resultados de uma série de pesquisas dispostas nas secretarias de saúde de Estados e Municípios confirmam a hipótese mais geral aventada inicialmente de que a prática da terceirização mostrou-se relevante seja para a obtenção de serviços de especialistas médicos como anestesiologistas, ortopedistas e mesmo pediatras, cirurgiões e clínicos gerais seja para a obtenção de serviços de apoio diagnóstico (como laboratório, radiologia etc.) ou terapêutico especializados (a exemplo da hemodiálise e da hemoterapia, entre outros).

Dessa forma, além de ser uma modalidade legal, o trabalho cooperado é eficaz por que tais entidades, como já foi dito, podem reduzir as despesas com pessoal em cerca de 30% (trinta por cento), sem comprometer a prestação dos serviços públicos, sem redução de salários ou cortes de pessoal”, preservando assim sua responsabilidade civil e social. E quando comparada com empresas não cooperativas para terceirização de serviços, a economia que a cooperativa proporciona diretamente gira em torno de 60 % a menos, pois normalmente as propostas das empresas causam um acréscimo de 90 a 100% no valor do custo inicial.

Ou seja, na terceirização por meio de cooperativas de trabalho, o trabalho por ser gerido pelos próprios sócios cooperados, torna-se mais barato, pois o trabalhador deixa de possuir os benefícios que uma CLT possa lhe assegurar para ser sócio de uma cooperativa e prestador de serviço como autônomo, com a finalidade de melhorar sua remuneração e as condições de trabalho, mediante Contrato Civil realizado entre a cooperativa de trabalho e o contratante, sem que isso signifique desamparo do trabalhador, pois o sócio-cooperado prestador de serviço deve realizar sua inscrição no INSS como contribuinte autônomo/individual, além de participar de reuniões e assembléias que a cooperativa venha a realizar sobre os interesses da classe.